Manuel Cintra
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ÁGUA
Chorei oceanos em que nem lágrimas cabiam, e parti o coração de uma vez ou em partes, e nunca encontrei cola da marca certa, e fiz enxertos na alma, e morri de repente ou às vezes com mais calma, e roguei pragas a primaveras teimosas que teimavam em despontar, e mergulhei em mim como quem cai no mar, e tive vertigens mais longas que a loucura, e entreguei-me demais, e às pancadas, ou docemente, ou com música mais ou menos dura, e esfolei-me em traições, e esbarrei com mentiras, e morri vezes sem conta, e deixei brotar rebentos de mim que nem suspeitava, e derrubei paredes em busca de verdades que não me queriam dar, e sufoquei com toda a força até encontrar ar, e detestei estar vivo por me terem morto, e abracei rios já sem braços ter
mas um dia vi-te num curto silêncio.
e compreendi a partilha.
e decidi renascer.
Manuel Cintra, fevereiro de 2012
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Não sei nunca por onde
a mão no bolso o pé sem chão
fico seco empedernido
com cara de senão
E não sei nunca por onde
começam as guerras
e se alguém morre não sei se morreu
ou se foi apenas mais uma guerra
que se perdeu
Não sei nunca por onde
acordo, desacordo, espicaço
dou importância a cada estilhaço
e paro sempre a meio
entre a morte e o cansaço
e grito por aí que não sou de aço
e que preciso de uma rosa
de um abraço, de um amigo
de um dia apenas para estar só
longe até do próprio umbigo
não sei se consigo
Manuel Cintra (in "Não sei nunca por onde", Quasi, 2004
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Um livro de poesia de qualidade por 6 euros?
ReplyDeleteNós, poetas, estamos entregues à bicharada...
O que se vende e dá dinheiro, é «lixo dado à estampa», como uma vez me disse o Eugénio.
Manuel, quero esse livro!