Thursday, 1 December 2011

Para o Natal, neste que é possivelmente o nosso último Dia da Restauração / The first of December - my Christmas post (This is perhaps the last time the nation of Portugal is allowed to celebrate Independance Day, or if you will "The Restoration of the Portuguese Sovereign Crown")

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(Brief note in English)

This post contains a short story in Portuguese written by a friend. For the time being it shall remain in the original tongue but as soon as I get a chance I shall write it out in English.

For now it stays thus and accompanying it here on today's post is a heartwarming piece of music. Please enjoy!
I shall also place links for places where one can give aid and help ease the burdens of the homeless or more fragile members of our society. PLease take a look and see if it gives you any ideas on how to help. Believe me, even one hour serving soup to whom ever needs it is more than rewarding.

Have a safe December.
Love G.

(Português)
Trago-vos algo escrito há muitos anos por um amigo. Confesso que tive de fazer uma grande birra para poder trazer isto aqui. Felizmente consegui.. Depois de lerem acho que me entenderão.
Aproveito para também deixar mais umas coisas enquanto vos desejo uma época natalícia mas digna, fraterna, e repleta de calor humano.
Segue o conto de José Pires F e por cima do mesmo, outra obra de natureza diferente e de beleza impar, (como sempre, acho que não sabe compor se não "preciosidades") para lhe fazer digna companhia, do nosso Eurico Carrapatoso.



Demos de caras no virar da esquina e assustei-me sem saber se havia motivo. Era alto, magro e envelhecido pela pobreza visível nas mãos inchadas das frieiras e nos lábios gretados pelo cieiro. Olhou-me. Primeiro com cara de poucos amigos, mas ao ver-me assustado depressa mostrou um sorriso tranquilizador. Compreendi que a carantonha inicial com que me tinha brindado se destinava a afastar possíveis e inesperados inimigos. Reparei, olhando-o agora mais calmo, que nos braços e na cara as impigens abriam feridas, eram as feridas da pobreza que o marcavam e marcam muitos sem-abrigo nos Invernos rigorosos.

Perguntei-lhe sem grande convicção se precisava de ajuda. Ele tirando a boina suja e safada do muito uso, abanou a cabeça num movimento concordante. Arrependi-me de imediato ao ver-lhe grandes peladas na cabeça e a visão da dentadura negra e desfalcada com que me brindou.Ele avançou um passo e eu recuei um outro, ele então recuou mas eu não avancei, estava bem assim. Naquela confortável distância lancei-lhe algo contrariado a pergunta: - E precisas do quê? Ele olhou-me de novo sem falar e com a mão que antes tinha no bolso do casaco fez um gesto que entendi como um vai-te lixar.

Compreendi que o meu recuo anterior, embora instintivo e talvez por isso, lhe tinha transmitido a mensagem errada do que eu era. Eu simplesmente não esperava aquela situação, não estava preparado, tinha sido apanhado de surpresa. Quem se julgava aquele esfarrapado sujo e doente para me julgar a mim? Recuou nos passos mas um pouco de recuo nos gestos não lhe faria mal algum.
Dispus-me a sair dali e ataquei a intenção em passo rápido quando, ele num sinal de dedos me pediu um cigarro. Naquele momento e pela primeira vez tive pena de não ser fumador, não era, em consequência não tinha cigarros. Ele com novo gesto de mão despachou-me como se dissesse que não era ali desejado.

No dia seguinte voltei. Vinha preparado com um maço de Marlboro no bolso e estava desejoso de ver a cara dele quando lho mostrasse. Agora que já lhe podia dar alguma coisa queria ver se me mandava lixar.
Procurei-o sem resultado, vi nas ruas por perto se lhe encontrava sinal mas nada, devia andar por outros sítios, pensei. Convenci-me que voltaria por ali e nos três dias seguintes voltei com o maço de cigarros no bolso, mas tinha desaparecido.

Finalmente, ao quarto dia, avistei-o ainda ao longe. Estuguei o passo sempre com o olhar a vigiá-lo não fosse ele desaparecer mais uma vez e aproximei-me. Quando se virou vi que não era o mesmo, este era mais novo e sem os sinais de doença do outro, era também mais forte e mais agradável. Olhou-me e sorriu de imediato dando as boas-noites. Aproximei-me ensaiando um sorriso e sempre preocupado em não demonstrar receio. Então, quando estávamos à distância de um braço, cumprimentei-o e estendi-lhe a mão com os cigarros. Ele com o gesto de os aceitar, agarrou-me o braço e desferiu-me um violento soco bem no meio da cara.

A pancada foi tal que fiquei um bom bocado atordoado, devia ter-me partido o nariz, pensei meio zonzo e com dores enquanto o agressor aproveitava para me aliviar da carteira e outros pertences. Felizmente um grupo de Skin Heads que descia do Bairro Alto, ao verem o que se passava, puseram o agressor em fuga seguindo-o em grande correria na direcção do Cais do Sodré. Após os ver desaparecer e ter recuperado a serenidade necessária, desloquei-me com alguma dificuldade à esquadra da zona com o propósito de receber os primeiros socorros e, principalmente, para apresentar queixa devido aos documentos que o agressor levara consigo. Um dos agentes quis vir comigo ao local e apercebi-me que se passava mais alguma coisa quando me pediu para no dia seguinte me apresentar na Judiciária.

Depois de uma longa conversa com o agente destacado para o caso, fiquei a saber que o larápio agressor do dia anterior era suspeito de ter morto um sem abrigo. Os indícios apontavam para a possibilidade de ser o mesmo que procurei.
Ao ver que a informação me abalara disse-me que os familiares do homem vinham a caminho para a identificação, mas era necessária também a minha confirmação de que era aquele homem que eu procurara e que tinha visto naquela noite. Movido pela curiosidade acedi deslocar-me com um agente à morgue para a necessária identificação.

Acabados de chegar fomos informados que o irmão do sem abrigo já o tinha identificado. Dirigimo-nos à sala onde estava o cadáver e ao transpor a porta dou de caras com o meu pai que, lavado em lágrimas, me olhou surpreendido.Atónito, instantes depois e pela sua boca, fiquei a saber que aquele sem abrigo era seu irmão, portanto meu tio. O tio mudo desaparecido e de quem eu ouvia falar desde que me lembrava.

Fazia dezoito anos que nunca mais soubéramos dele, agora, devido a um papel encontrado no bolso do casaco onde alguém tinha escrito que ele era o José Emanuel Laranjeira e que procurava o irmão António Leonardo Laranjeira tinha sido identificado.
Quando interiorizei a informação, já sabia que era essa a ajuda que ele queria. Ao avançar para mim preparava-se para me mostrar o papel, e eu, seu sobrinho, tinha recuado com medo. Instantes depois compreendi finalmente que não era medo. Era algo pior, mais profundo e enraizado, era um mal de alma. (José Pires F)
photograph by G. Almeida - November - 2011








Food Bank For New York City


UK - The Food Bank

2 comments:

  1. Belíssimo post com o texto do José F. Pires e a música do Eurico Carrapatoso!
    Obrigado.

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  2. Obrigada eu pelas tuas palavras! E aproveito também para agradecer o José pelo texto, e Eurico Carrapatoso pela música.

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